segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Lugar nenhum

Hoje peguei um ônibus pra lugar nenhum.

Do meu lado se sentavam velhos, que relembravam seus anos áureos, de corpos rijos, pele lisa, olhar intenso, me falavam sobre os dias que viveram com belas mulheres, que visitaram belos lugares, todos eles estavam ali, tentando me dizer alguma coisa com aqueles olhos fundos.

Um senhor me dizia, meu jovem, não deixe de viver as coisas que deseja, não deixe nunca, fui criado numa família tradicional, era apaixonado por uma moça, ela me fazia brilhar os olhos, meus pais arranjaram um casamento pra mim, eu olhava a minha mulher todos os dias e lembrava daquele olhar que eu não tinha, fiquei casado 30 anos, minha mulher morreu, e o tempo também me matou, hoje eu não tenho a mulher, nem a moça e também não lembro mais do olhar, eu tento todos os dias quando acordo, e choro pela manhã por não conseguir, tenho dormido mais que o normal pra ver se consigo sonhar com ela ao menos, sem sucesso algum.

Uma senhora ouviu a conversa e emendou, filho, eu vivi com medo a vida toda, medo de não ser a esposa ideal, de não saber o que fazer na cama, de não ter certeza se queria filhos, ou uma família, o tempo passou e hoje eu tenho medo de olhar no espelho, envelheci, hoje levantam pra mim no ônibus, nunca fui casada, nem tive muitos amores, não tenho um filho pra cuidar de mim ou ao menos me colocar num asilo, um dia me encontrarão sozinha caída no banheiro, dias depois da minha morte, e só perceberão que morri pelo cheiro, eu não faço falta pra ninguém, sou apenas uma contra o mundo e é só o mundo que tenho.

Meu ponto chegou, desci perto de casa e decidi, nunca mais pegaria um ônibus pra lugar nenhum.

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