domingo, 25 de dezembro de 2011

Meia noite em Paris

Woody Allen, finalmente, encontrou a sua Nova York europeia. Depois de passar por Barcelona e, demasiadamente, insistir com Londres, o cineasta aporta na Cidade Luz para contar a sua mais bela história em anos. Com “Meia Noite em Paris”, Allen demonstra-se ousado através de um projeto que já parecia idealizado antes mesmo de ser produzido. A impressão é de que Paris e Allen aguardavam a possibilidade desse encontro há tempos e dele nasce uma química natural, descontraída e, acima de tudo, fantástica.

Tudo porque o diretor resolve resgatar o realismo mágico que utilizou anteriormente em “Neblina e Sombras” (1991) e, mais eficientemente, em “A Rosa Púrpura do Cairo” (1985). O recurso permite que seu protagonista volte no tempo, não só para exaltar Paris (uma das poucas cidades que permitem que tal retorno seja possível sem grandes inclusões técnicas), mas também para homenagear os seus artistas preferidos, “ressuscitando-os” com uma inocência e comicidade que apenas Woody Allen seria capaz de fazer.

O alterego do diretor desta vez chama-se Gil (Owen Wilson), um roteirista norte-americano bem-sucedido, mas frustrado. Ele quer ser escritor e também, depois de conhecer a capital francesa, morar por lá. A noiva Inez (Rachel McAdams), no entanto, discorda. Ela odeia a simples ideia de deixar os Estados Unidos. Mas Paris exerce um tamanho fascínio sobre Gil (especialmente se estiver chuvosa) que faz com que ele embarque em uma viagem até os anos 20, onde encontra a si mesmo e, especialmente, os mais consagrados artistas do último século, das mais diversas áreas.

Estão lá os escritores F. Scott Fitzgerald e Ernest Hemingway, o músico Cole Porter, o pintor Pablo Picasso e o cineasta Luis Buñuel, dentre outros que esbarram com o personagem com a naturalidade de um habitual encontro, sendo essas reações (também compartilhada por Gil) o principal atrativo cômico do filme. Mas “Meia Noite em Paris” não foi feito para fazê-lo gargalhar intensamente. O objetivo de Allen é muito mais fascinar com as possibilidades que a sua imaginação permita que aconteçam. E que imaginação! A cada badalada que soa na madrugada parisiense, a ânsia pela personalidade artística que conheceremos adiante já faz um sorriso abrir de orelha a orelha.

E a gratificação vem, principalmente, pelo fato de Woody Allen não levar seu texto a sério, pondo a descontração em primeiro lugar, fazendo seus históricos artistas colocarem-se em situações que jamais imaginaríamos, como se declararem invejosos ou estarem envolvidos em confusos enlaces amorosos. Vê-los em comuns mesas de bar discutindo temáticas super relevantes, que hoje são motivos das mais profundas pesquisas científicas, é de um prazer difícil de descrever. E tudo acontece de uma forma bem simples, sem necessidades de efeitos especiais ou conceituada direção de arte.

Paris parecia estar pronta para receber o que Allen tinha para contar, e toda essa loucura temporal não poderia ser possível em nenhuma outra capital mundial, tanto do ponto de vista técnico quanto narrativo. A preservação das antiguidades, além da própria história da metrópole (palco de diversas manifestações e movimentos artísticos) a credenciam para contar tal trama eterna. Valorizando os tempos passados, o roteiro reflete também sobre a atualidade e a mania que temos de exaltar o passado e desqualificar o presente. Para tanto, é preciso dar uma rápida passada no século XIX, possível num piscar de olhos.

O longa traz ainda uma tocante história de amor impossível, palavra que aqui assume um outro sentido. Se Allen exagera na composição da personagem Inez, uma mulher que nunca deveria ser companheira de Gil, acerta em cheio na criação de Adriana, a moça que teria servido de inspiração para um quadro de Picasso na década de 20. Bela e extremamente sensual, a estudante de alta costura atrai não só os olhares do protagonista, mas também do público, certificação de mais um desempenho notável da sempre competente Marion Cotillard, na melhor atuação do filme.

Owen Wilson também merece destaque. Sem querer imitar os trejeitos do clássico personagem que encarna, o ator aposta no carisma que já provou que tem de sobra. É um homem indeciso, inseguro, mas ciente de que deve fazer algo com sua vida. E não há melhor escolha do que ficar na Paris exibida por Woody Allen, especial em cada esquina, que ficam ainda mais atraentes debaixo de chuva. Um local de inspiração artística, seja para pintores, escritores ou cineastas, especialmente se ele tiver a categoria desse norte-americano que dirige e escreve este adorável trabalho. Simplesmente adorável! 

Critica: Darlano Dídimo/Cinema com Rapadura 

2 comentários:

  1. "O objetivo de Allen é muito mais fascinar com as possibilidades que a sua imaginação permita que aconteçam."

    E ele conseguiu

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  2. Um grande filme é aquele que traz elementos de uma maneira tal que o espectador sinta desejo de assisti-lo várias vezes. Como todos os espectadores são diferentes, cada um tendo seus interesses e sua história de vida, é impossível um filme agradar a todos neste sentido de provocar mais de uma "assistida". No caso deste filme de Allen, não senti vontade de assisti-lo mais uma vez. Gostei da beleza da cidade de Paris retratada pelo cineasta, mas isto não basta para ser considerado um grande filme.

    Pensando bem, cada um tem sua lista de "grande filme". Quando alguém diz pra vc que filme tal é um "grande filme", é tudo baseado em critérios que não necessariamente vão atrair todos os espectadores.

    De Allen até agora (pelo que rapidamente revejo em minha memória) o que eu mais gostei foi Match Point. Também tem outro que se eu não me engano é com Adam Sandler...

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