segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Cisne negro

O artista é louco e frágil ao mesmo tempo. Ele se entrega à arte, seja ela qual for, e se desintegra dentro dela. É preciso dar um resultado, não somente para o admirador, mas para ele mesmo. O artista é capaz de se transformar em sua arte para conseguir o resultado perfeito. “Cisne Negro” é uma leitura da arte como obsessão, que busca um perfeccionismo que pode ser destrutivo, ainda que eu acredite que o longa possa ser interpretado de inúmeras formas (todas maravilhosas).

Na trama, Natalie Portman interpreta Nina, uma bailarina correta e rigorosa consigo mesma. Nina sabe que é talentosa, mas sua ingenuidade e fragilidade a transformam em presa fácil no meio das outras bailarinas. Ela então tem a oportunidade que sempre sonhou: estrelar uma nova adaptação de “O Lago dos Cisnes”, de Tchaikovsky, que mostra a dualidade entre o cisne negro e o cisne branco, uma espécie de bem e mal. Enquanto Nina se prepara para o papel, seu psicológico se desintegra até que ela se transforma no próprio Cisne.

No prólogo de “Cisne Negro”, vemos Portman dançar junto com a câmera de Darren Aronofsky, quando a atriz e o cineasta se encontram em uma sequência reveladora. Portman, exímia intérprete, e Aronofsky, diretor competente, estão juntos nesta cena para levar ao público uma experiência sensorial e emocional há muito tempo não vista. Eles, como pessoas reais e não como personagem/diretor de um filme, se transformam na própria obra cinematográfica. É nesta transformação entre Portman/Nina e Aronofsky/Aronofsky que o filme se mostra perfeito e íntimo.

Darren Aronofsky demorou um tempo para ser reconhecido e sua indicação ao Oscar é tardia. Assim como os especialistas ignoram o seu talento, o público também não compreendia por completo as ideias do cineasta em suas obras. Natalie Portman, com uma filmografia sempre correta, também teve problemas com o reconhecimento nas premiações, ainda que seja a queridinha do público. Com “Cisne Negro”, os dois alcançam o merecido reconhecimento. Ele pela filmografia genial (ainda que “Fonte da Vida” seja sua obra prima master) e ela por ser a maior revelação dos últimos anos no Cinema, com uma carreira que no futuro será a única se igualar a Meryl Streep.

Em “Cisne Negro”, temos perfeição técnica fílmica. Não detalharei questões como trilha sonora, fotografia, edição e efeitos visuais porque eles não são elogiáveis separadamente. O longa é completo per si, chegando a uma perfeição estética assustadora e sensível ao mesmo tempo. Aronofsky acertou em todos os detalhes da produção, principalmente no elenco, que dança durante toda a projeção. Além de Portman, o bom desempenho de Vincent Cassel, Barbara Hershey e principalmente de Mila Kunis completam o delírio.

Apesar da repercussão dos filmes e dos mais novos fãs de Aronofsky, o Oscar não entregará a estatueta ao cineasta, mas somente para Portman. Mesmo assim, o reconhecimento é essencial e reforça a nova tendência dos filmes cults comerciais, como foi com “A Origem” e geralmente é trabalhado por diretores como Quentin Tarantino e Pedro Almodóvar. Aronosfky tem muito talento para continuar se superando a cada película (excetue o vindouro “The Wolverine”), então uma estatueta não precisa ser imediata e certamente virá em algum momento.

“Cisne Negro” é um espetáculo inigualável e causa sensações variadas, saindo do lugar comum sem ir muito longe. O filme reforça que a magia da Sétima Arte continua em grandes histórias contadas por grandes cineastas, não somente em filmes fast food que arrecadam grandes bilheterias. Que muitos outros “Cisnes Negros” possam vir nos próximos anos para que, assim como um dia Griffith, Bergman, Eisenstein, Glauber Rocha, etc escreveram linhas na história do cinema mundial, daqui a mais 100 anos sejamos reconhecidos por grandes produções e realizadores.

Fonte: Diego Benevides/Cinema com rapadura 




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