terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Rascunhos

Noites
E noites
Pensando
Riscando
Traços sem fim
Traços e traços
De caminhos distantes
E dispersos
Mas unidos
Olhar distraido
Mãos espertas
E a pequena viagem para um mundo
Diferente
Sonhado
E nunca imaginado
Vem felicidade
Vai tristeza
Vem companhia
Vai solidão
Um eterno vem e vai
De uma eterna história
De paz
De choro
De glória

José e Pilar

Em José e Pilar (2010), a intenção do cineasta lusitano Miguel Gonçalves Mendes é mostrar o relacionamento de José Saramago com a jornalista espanhola Pilar Del Río. No entanto, a impressão mais forte que fica é o retrato do escritor, já "próximo da porta de saída", como ele mesmo, aos 84 anos, descreve seu momento de vida.

Com sua morte tão recente - foi em 18 de junho deste ano, aos 87 anos, que Saramago veio a falecer -, acompanhar o Nobel da Literatura nas telas até em cenas banais, como jogando Paciência no computador, dará um sentimento de saudade aos fãs. Em alguns momentos, até se esquece que aquele velhinho afável é o autor de obras tão controversas, que despertaram a ira de conservadores e católicos ao redor do mundo.

José e Pilar, que começou a ser rodado em 2006, acompanha o dia-a-dia de Saramago enquanto escreve A Viagem do Elefante e sua posterior turnê de lançamento. Ali tomamos conhecimento do suporte prestado por Pilar, que administra a agenda do autor, seus compromissos, cartas e convites para participar de solenidades. Chega a ser cômica a esnobada de Saramago a um convite do Dalai Lama, cujos assessores parecem ter esquecido a convicção de ateu e comunista do escritor.

No entanto, apesar de Pilar mostrar-se uma mulher extraordinária, de forte visão política e apresentar muita classe ao revidar os ataques da imprensa lusitana, que tenta retratá-la como a Yoko Ono da Península Ibérica, sua presença no filme é sempre secundária ao carisma de Saramago. É evidente a paixão do casal e talvez o José como o conhecemos não existiria se não fosse por Pilar, mas é apenas por causa do marido e das polêmicas que o relacionamento gerou que ela se torna merecedora de destaque - Pilar é 26 anos mais jovem que ele, acusada de roubar Saramago de sua pátria-mãe para viver nas Ilhas Canárias, entre outras pirraças dos portugueses.

Como narrativa, um dos principais méritos do filme é não se utilizar da linguagem tradicional do gênero documentário, mas ainda assim cumprir sua função. Não temos aqui entrevistados sentados em um cenário previamente preparado e trechos de notícia só são inseridos quando José e Pilar estão realmente assistindo a TV ou ouvindo rádio.

Assim, chegando ao fim do texto somos levados de volta ao primeiro parágrafo, para elaborar o ponto mais tocante desta história, que não é o amor de José e Pilar. São as reflexões sobre a finitude da vida, trazidas ao espectador pelas declarações de Saramago, que ficam após os créditos. E realmente, não deve haver tristeza e sentimento de impotência maior que "sentir, como perda irreparável, o findar de cada dia".

Crítica: Carina Toledo/Omelete

Lapso

Dessa vez eles estavam ali
Era noite
Eu não estava ali
Não pra eles
Seres
Todos os seres
E todas as pessoas
Que tentavam rir alto sobre piadas sem graça
E eu estava ali
Mas só de corpo
Minhas idéias voavam longe
Eles não existiam
Não pra mim
Não naquela noite
Sim, eu repitiria isso varias vezes
Eu tinha me cansado
A forma como eles mexiam as mãos
Ou trocavam olhares
O jeito de balbuciar suas verdades
Me irritavam um tanto
Eram apenas mesas
Cadeiras
Uma rua sem graça no fim do mundo
Árvores, umas poucas
E pessoas
Que pouco me importavam
E eu estava ali
Mas não para eles.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Vladimir Nabokov

Vladimir Vladimirovich Nabokov (em russo: Влади́мир Влади́мирович Набо́ков; São Petersburgo, 22 de abril de 1899 — Montreux, Suíça, 2 de julho de 1977) foi um escritor russo-americano. Nabokov escreveu seus primeiros nove romances em russo e então chegou à fama internacional como um mestre estilista de prosa em inglês. Também fez contribuições para a entomologia e tinha interesse em problemas de xadrez.

Lolita (1955) é frequentemente citado entre seus romances mais importantes e é o mais conhecido, apresentando o amor por intrincado jogo de palavras e o detalhe descritivo que caracteriza todas as suas obras. O romance foi classificado na quarta posição na lista dos 100 melhores romances da Modern Library. Sua autobiografia intitulada Speak, Memory foi listado na oitava posição na lista dos livros de não-ficção da Library Modern.

Nascido numa família da antiga aristocracia, em 1919, a instabilidade produzida pela revolução bolchevique (1917) obrigou-o a abandonar a União Soviética. Estudou em Cambridge e licenciou-se em literatura russa e francesa. Mudou-se para Berlim, onde iniciou sua produção literária e intenso trabalho como tradutor.

Em 1926, foi publicado seu primeiro romance, Maria, acolhido com interesse e consideração. Fugindo dos exércitos nazistas e após uma estada em Paris, chegou em 1940 aos Estados Unidos, onde se dedicou ao ensino de língua e literatura russa em várias universidades. Embora continuasse a escrever na sua língua materna, começou também a escrever em inglês, publicando o seu primeiro romance nesta língua em 1941 (The Real Life of Sebastian Knight). Publicou, em 1955, o polêmico romance Lolita em inglês.

A partir de 1958, o sucesso alcançado por seus livros permitiu-lhe dedicar-se inteiramente aos seus principais interesses, a literatura e a entomologia.

Vida e carreira
Nabokov era o mais velho dos cinco filhos do advogado, político e jornalista liberal Vladimir Dmitrievich Nabokov e sua esposa, Elena Ivanovna Rukavishnikova. Nasceu numa família rica e proeminente da nobreza sem título de São Petersburgo. Entre seus primos está o compositor Nicolas Nabokov. Passou sua infância e juventude em São Petersburgo e na propriedade rural Vyra, perto de Siversky, ao sul da cidade.

A infância de Nabokov, que ele chamou de "perfeita", foi notável em vários aspectos. A família falava russo, inglês e francês no seu agregado familiar e Nabokov era trilingue desde tenra idade. Na verdade, para grande desgosto patriótico de seu pai, Nabokov soube ler e escrever inglês antes do russo. Em Speak, Memory Nabokov recorda inúmeros detalhes de sua infância privilegiada e sua capacidade de recordar detalhes vívidos nas memórias de seu passado foi uma bênção para ele durante seu exílio permanente, bem como proporcionou um tema que ecoa desde seu primeiro livro, Mary, e por todo o caminho até obras tardias, como Ada or Ardor: A Family Chronicle. Enquanto a família era nominalmente ortodoxa, não eram muito ligados à religião e o pequeno Vladimir não foi forçado a frequentar a igreja depois que perdera o interesse. Em 1916, herdou a propriedade Rozhdestveno, perto de Vyra, de seu tio Vasiliy Ivanovich Rukavishnikov ("tio Ruka" em Speak, Memory), mas perdeu-a na revolução um ano mais tarde. Esta foi a única casa que possuiria em toda sua vida.

Emigração
Após a Revolução de Fevereiro de 1917, Vladimir Dmitrievich Nabokov tornou-se secretário do Governo Provisório Russo e a família foi forçada a fugir da cidade após a Revolução de Outubro para a Crimeia, não esperando ser afastada por muito tempo. Moravam na propriedade de um amigo e em setembro de 1918 mudaram-se para Livadia, na Ucrânia. O pai de Nabokov foi um ministro da justiça do governo provisório da Crimeia. Após a retirada do Exército alemão (novembro de 1918) e da derrota do Exército Branco no início de 1919, os Nabokovs partiram para o exílio na Europa Ocidental. Em 2 de abril de 1919, a família deixou Sevastopol no último navio. Estabeleceram-se brevemente em Inglaterra, onde Vladimir foi matriculado no Trinity College, em Cambridge, e estudou eslavo e [línguas românicas]. Mais tarde, valeu-se de suas experiências de Cambridge para escrever o romance Glory. Em 1920, sua família mudou-se para Berlim, onde seu pai criou o jornal imigrante Rul (Leme). Nabokov seguiria a Berlim após seus estudos em Cambridge, dois anos depois.

Romances e contos
Machenka (1926)
Rei, Valete, Dama (1928)
A Defesa (1930)
Glória (1932)
Riso no Escuro (1933)
Desepero (1934)
A dádiva (Brasil) // O Dom (Portugal) (1938)
Convite para uma decapitação (1938)
O olho vigilante (1938)
A verdadeira vida de Sebastian Knight (1941)
Lolita (1955)
Pnin (1957)
Fogo Pálido (1962)
Na outra margem da memória (1966, autobiografia)
Ada ou Ardor: Uma crônica de Família (1969)
Transparências (1972)
Opiniões Fortes (1973, colectânea de entrevistas, recensões e de cartas a editores e críticos)
Somos todos arlequins (1974)
Encantador (1986, publicação póstuma)
O Original de Laura (2009, publicação póstuma)

Citações
Era uma vez um homem que se chamava Albinus e vivia em Berlim. Era rico, respeitável, feliz; certo dia abandonou a mulher por causa de uma jovem amante; amou, não foi amado; e sua vida acabou em desastre.

Deu-se conta então de que, se não quisesse passar a vida num estado de permanente tortura, tinha de apagar da memória a imagem da família e abandonar-se por inteiro à paixão intensa, quase mórbida, que lhe inspirava a alegria descontraída de Margot.

Sou suficientemente orgulhoso de saber alguma coisa para ter a modéstia de admitir que não sei tudo.

Nossa existência não é mais que um curto circuito de luz entre duas eternidades de escuridão.

Ao homem livre não faz falta um deus.

Tinha sido amor à primeira vista, à última vista, às vistas de todo o sempre.

Player

Todas as canções
Todas as melodias
Todas as letras
Todos os cantores
Não serão nada
Se todos os momentos
Não forem com você
Todos os dias
Todas as horas
Só são todas
Quando você existe pra mim
E eu existo pra você.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Pina

Há um certo incômodo inicial ao se ver Pina, documentário de Wim Wenders sobre a coreógrafa alemã Pina Bausch, uma das maiores da história da dança. Morta em junho de 2009, sua obra monumental estaria, com sua morte, condenada a desaparecer. É com pesar que se começa a ver o filme: aquela beleza toda prestes a perecer. Mas Pina, o documentário, porém está longe, muito longe de ser um grande funeral da artista. Termina como uma boa parte de suas peças, com humor e nenhum traço de amargura. Alguns dançarinos entrevistados afirmam que, após trabalhar com Pina Bausch por 22 anos, não sabem o que vai ser de suas vidas sem ela; Wenders captura as imagens, todas carregadas de emoção.

Como Pina morreu no auge da carreira, o que vemos na tela é o que há melhor na dança contemporânea do final do século 20 e início do 21. Da primeira fase da carreira da artista, mais sombria, vemos duas obras seminais, Café Müller, de 1978 (que Pedro Almodóvar usou na abertura de seu Fale com Ela [Hable Com Ella, 2002]), e Le Sacre du Printemps, de 1975 (versão de Pina para um clássico A Sagração da Primavera, com música de Igor Stravinsky). Da segunda fase da carreira da coreógrafa, Konthakthof, de 2000, e Vollmond, de 2006. São escolhas acertadas por parte do diretor alemão: não só vemos as duas fases da carreira da artista (e a prova de que a sua arte não envelheceu em absolutamente nada desde os anos 70, quando as peças foram criadas) como duas peças mais tradicionais, "dança pura" (Le Sacre du Printemps e Konthakhof), e duas com estruturas que só têm razão de ser nas peças de Pina Bausch.

Wenders filma tudo com requinte e bom gosto, fazendo leves e irônicos comentários das peças, bem ao estilo de Pina, como ao usar atores de verdade nas encenações de Konthakthof, e principalmente ao usar a cidade da companhia, a industrial Wuppertal, ela mesmo uma parte do filme. Explica-se: Pina e seus dançarinos buscavam inspiração no cotidiano, no dia-a-dia das pessoas comuns, gestos inusitados que qualquer um pode ver no metrô indo para o trabalho. Nada mais natural que, num filme, devolver o material ao seu lugar de origem.

Wenders, realmente inspirado nessa sua homenagem a uma artista tão especial, ousou usar a mesma estrutura das peças de Pina para criar seu documentário. Pina não criava as coreografias e depois fazia seus dançarinos repeti-la: ela a tirava deles, usando a bagagem pessoal de cada um deles para criar suas peças. A Wuppertal Tanztheater é seus bailarinos. As coreografias de Pina Bausch são criações de seus bailarinos. Pina as extraía, as montava e lhes dava corpo. O resultado é ao mesmo tempo extrovertido e confessional. Wenders fez a mesma coisa e usou depoimentos dos dançarinos entrecortados de suas atuações. Cada dançarino falou no seu próprio idioma, e sim, ouvimos Regina Advento falar em português, depoimento esse que vai resumir o filme inteiro: uma homenagem densa, porém bem humorada, como a coreógrafa gostaria.

Além das escolhas certas sobre o que filmar e de como fazê-lo, Wenders também acertou pelo que deixou de fora, como a infrutífera discussão se o que Pina Bausch faz é dança ou teatro - o assunto, motivo de discussões inócuas há décadas, é sugerido no trailer, mas felizmente o diretor não caiu nessa armadilha (é óbvio que é dança, a dramaturgia que está ali não é a mesma do teatro tradicional, o que interessa a Pina é o movimento, os gestos, não contar histórias e diálogos). Além disso, Wenders passou ao largo das eternas polêmicas envolvendo a obra de Pina nos EUA, onde foi e continua sendo atacada (hoje, menos). Em especial nas páginas das revista New Yorker, quando a reacionária crítica Arlene Croce e sua substituta Joan Acocella acusam Pina de não ter técnica para dançar, de fazer peças violentas, com estupros e toda sorte de ataques às mulheres, do fato de os homens serem constantemente humilhados em cena, da falta de consistência de suas peças (seriam apenas um amontoado de esquetes unidos apenas pelo tema) e, claro, da duração excessiva, de ter sexo misturado com crueldade e absurdo, e um interminável etc.

Há também entrevistas de arquivo (bem poucas) em que Pina, sempre com um cigarro na mão, dizia não servirem as palavras para descrever a dança, de forma que Wenders nem vai usar muito a palavra, logo ele, tão prolixo, para descrever o trabalho da coreógrafa. É no entanto triste ver Pina fumando tanto (ela pedia vôos com escala quando viajava da Alemanha para os EUA justamente para fumar durante as trocas de avião), sabendo que será um câncer a causa da sua morte aos 68 anos.

Toda essa sofisticação do documentário é o que a gente espera mesmo de Wim Wenders. Wenders era considerado um grande diretor até o final dos anos 80, principalmente depois que venceu o Festival de Cannes com Paris, Texas (idem, 1984) ou com os anjos cruzando o então em pé Muro de Berlim de Asas do Desejo (Der Himmel über Berlin,1987). De lá para cá, só fez filme ruins, alguns brutalmente horrorosos, que nem o sucesso de outro documentário, o indicado ao Oscar Buena Vista Social Club (idem, 1999), conseguiu aplacar sua má fama de espanta-bilheteria (seria Wenders melhor documentarista que diretor?). Em Pina ele soube ser detalhista, bem humorado, fez inserções realmente esclarecedoras, filmou tudo de maneira elegante e plástica, aproveitando-se dos figurinos de Marion Cito e da música de Thomas Hanreich, colaboradores de Bausch. Sua pesquisa foi densa e muito bem informada, vê-se que o diretor está falando de um assunto que domina bastante e aparentemente lhe é caro. Há momentos geniais, como os dos dançarinos praticamente contracenando com as engrenagens do metrô.

Pina abriu o deslumbrado Festival de Toronto e é a indicação da Alemanha para o Oscar de melhor filme estrangeiro. Muito difícil afirmar que o filme conseguirá atingir uma plateia mais ampla daquela que conhece dança contemporânea ou mesmo os inúmeros fãs de Pina Bausch. De qualquer forma, Pina é muito mais elaborado e melhor de se ver que 90% dos documentários de dança que passam na TV a cabo, como o (mais uma vez...) indicado ao Oscar Dancemaker (1998), de Matthew Diamond, sobre o coreógrafo americano Paul Taylor, ou o aclamado La Danse: The Paris Opera Ballet (2009), de Frederick Wiseman, para citar dois dos mais bem sucedidos da área feitos recentemente, no qual o didatismo arruina qualquer possibilidade de excitação em frente à obra que está sendo analisada. Pina estaria mais próximo de Crumb (1994), de Terry Zwigoff, semi biografia, semi documentário sobre a obra do desenhista americano Robert Crumb: são obras que, para dar conta do universo dos seus artistas retratados, vão além da simples narração biográfica, exposição das obras mais importantes e depoimentos dos principais atores na vida do artista em questão.

Talvez por ter feito uma obra para público restrito, em tese aberto a inovação, Wenders foi mais longe do que o habitual. Tomara que a experiência ajude o diretor a encontrar um rumo em sua carreira comercial.

Crítica: Demetrius Caesar/Cineplayers

Limpando a neblina

Nos conhecemos por acaso
Mal sabiamos o que estava por vir
Garoto
E garota
Conversaram por horas
E horas
E as horas passaram
E trouxeram
Os momentos mais puros
Os planos
Os olhares
A vontade louca de estar junto
Lágrimas
Sorrisos
Um descontrole de emoçóes
Que cresciam furtivamente a cada dia
Ela e seu jeito de mexer com as mãos
Ele e seu jeito de a olhar de perto
Dias
Noites
Madrugadas inteiras
Se seguiram
E com elas vieram um elo
Sereno e eterno
Que mudaria tudo
Ela seguiria seu rumo
Ele seguiria o dele
E duas estradas se cruzariam logo a frente
Quando finalmente
Pudessem estar juntos.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Moacyr Scliar

Moacyr Jaime Scliar (Porto Alegre, 23 de março de 1937 — Porto Alegre, 27 de fevereiro de 2011) foi um escritor brasileiro. Formado em medicina, trabalhou como médico especialista em saúde pública e professor universitário. Sua prolífica obra consiste de contos, romances, ensaios e literatura infantojuvenil. Também ficou conhecido por suas crônicas nos principais jornais do país.

Biografia
Filho de José e Sara Scliar, Moacyr nasceu no Bom Fim, bairro que concentra a comunidade judaica. Alfabetizado pela mãe, professora primária, a partir de 1943 cursou a Escola de Educação e Cultura, daquela cidade, conhecida como Colégio Iídiche. Transferiu-se, em 1948, para o Colégio Nossa Senhora do Rosário (católico).

Em 1963, após se formar pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, iniciou sua vida como médico, fazendo residência médica. Especializou-se no campo da saúde pública como médico sanitarista. Iniciou os trabalhos nessa área em 1969. Em 1970, frequentou curso de pós-graduação em medicina em Israel. Posteriormente, tornou-se doutor em Ciências pela Escola Nacional de Saúde Pública. Foi professor da disciplina de medicina e comunidade do curso de medicina da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).

Moacyr Scliar era torcedor do Cruzeiro, de Porto Alegre. Devido a sua morte, os jogadores do Cruzeiro fizeram uma homenagem para este torcedor-símbolo do clube, entrando de luto na partida contra o Grêmio, no dia 27 de fevereiro, que contou com um minuto de silêncio em homenagem a Scliar.

Carreira
Scliar publicou mais de setenta livros. Seu estilo leve e irônico lhe garantiu um público bastante amplo de leitores, e em 2003 foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, tendo recebido antes uma grande quantidade de prêmios literários como o Jabuti (1988, 1993 e 2009), o Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) (1989) e o Casa de las Américas (1989).
Suas obras frequentemente abordam a imigração judaica no Brasil, mas também tratam de temas como o socialismo, a medicina (área de sua formação), a vida de classe média e vários outros assuntos. O autor já teve obras suas traduzidas para doze idiomas.

Em 2002 ele se envolveu em uma polêmica com o escritor canadense Yann Martel, cujo famoso romance A Vida de Pi, vencedor do prêmio Man Booker, foi acusado de ser um plágio da sua novela Max e os felinos. O escritor gaúcho, no entanto, diz que a mídia extrapolou ao tratar do caso, e que ele nunca teve o intuito de processar o escritor canadense.

Entre suas obras mais importantes estão os seus contos e os romances O ciclo das águas, A estranha nação de Rafael Mendes, O exército de um homem só e O centauro no jardim, este último incluído na lista dos 100 melhores livros de temática judaica dos últimos 200 anos, feita pelo National Yiddish Book Center nos Estados Unidos.

Adaptação para o cinema
Em 1998, o romance "Um Sonho no Caroço do Abacate" foi adaptado para o cinema, com o título "Caminho dos Sonhos", sob a direção de Lucas Amberg. O filme participou dos festivais de Gramado, Miami, Trieste e outros. O filme narra a história do filho de um casal de imigrantes judeus lituanos que se estabelece no bairro do Bom Retiro, em São Paulo, nos anos 1960. O jovem Mardo (Edward Boggiss) apaixona-se por Ana (Taís Araújo), uma estudante negra. Os jovens encontram no amor a força e a determinação para enfrentarem a discriminação na escola onde estudam e o preconceito entre as famílias.

Em 2002, o romance Sonhos Tropicais foi adaptado para o cinema sob a direção de André Sturm, com Carolina Kasting, Bruno Giordano, Flávio Galvão, Ingra Liberato e Cecil Thiré no elenco. O filme relata o combate à febre amarela no Rio de Janeiro, comandado pelo médico sanitarista Oswaldo Cruz, e a resistência da população à vacinação obrigatória, que resultou na chamada Revolta da Vacina. Em paralelo, é narrada a história de uma jovem judia polonesa, que imigra para o Brasil em busca de uma vida melhor, mas acaba por se prostituir.

Morte
Scliar morreu por volta da 1h do dia 27 de fevereiro de 2011, aos 73 anos, de falência múltipla dos órgãos. Ele estava internado no Hospital de Clínicas de Porto Alegre desde o dia 11 de janeiro, quando deu entrada para a retirada de pólipos (formações benignas) no intestino. A cirurgia foi bem sucedida, mas o escritor acabou tendo um acidente vascular cerebral (AVC) no dia 17 de janeiro, durante o período de recuperação, falecendo quase cinquenta dias depois de sua entrada no hospital

Obra
Contos
O carnaval dos animais. Porto Alegre, Movimento, 1968
A balada do falso Messias. São Paulo, Ática, 1976
Histórias da terra trêmula. São Paulo, Escrita, 1976
O anão no televisor. Porto Alegre, Globo, 1979
Os melhores contos de Moacyr Scliar. São Paulo, Global, 1984
Dez contos escolhidos. Brasília, Horizonte, 1984
O olho enigmático. Rio, Guanabara, 1986
Contos reunidos. São Paulo, Companhia das Letras, 1995
O amante da Madonna. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1997
Os contistas. Rio, Ediouro, 1997
Histórias para (quase) todos os gostos. Porto Alegre, L&PM, 1998
Pai e filho, filho e pai. Porto Alegre, L&PM, 2002
Histórias que os jornais não contam. Rio de Janeiro, Agir, 2009.

Romances
A guerra no Bom Fim. Rio, Expressão e Cultura, 1972. Porto Alegre, L&PM
O exército de um homem só. Rio, Expressão e Cultura, 1973. Porto Alegre, L&PM
Os deuses de Raquel. Rio, Expressão e Cultura, 1975. Porto Alegre, L&PM
O ciclo das águas. Porto Alegre, Globo, 1975; Porto Alegre, L&PM, 1996
Mês de cães danados. Porto Alegre, L&PM, 1977
Doutor Miragem. Porto Alegre, L&PM, 1979
Os voluntários. Porto Alegre, L&PM, 1979
O Centauro no Jardim. Rio, Nova Fronteira, 1980. Porto Alegre, L&PM (Tradução francesa:"Le centaure dans le jardin" ),Presses de la Renaissance, Paris
Max e os felinos. Porto Alegre, L&PM, 1981
A estranha nação de Rafael Mendes. Porto Alegre, L&PM, 1983
Cenas da vida minúscula. Porto Alegre, L&PM, 1991
Sonhos tropicais. São Paulo, Companhia das Letras, 1992
A majestade do Xingu. São Paulo, Companhia das Letras, 1997
A mulher que escreveu a Bíblia. São Paulo, Companhia das Letras, 1999
Os leopardos de Kafka. São Paulo, Companhia das Letras, 2000
Uma história farroupilha. Porto Alegre, L&PM, 2004
Na noite do ventre, o diamante. Rio de Janeiro: Ed. Objetiva, 2005
Ciumento de carteirinha Editora Ática, 2006
Os vendilhões do templo Companhia das Letras, 2006
Manual da paixão solitária. São Paulo: Companhia das Letras
Eu vos abraço, milhões. São Paulo: Companhia das Letras

Ficção infantojuvenil
Cavalos e obeliscos. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1981; São Paulo, Ática, 2001
A festa no castelo. Porto Alegre, L&PM, 1982
Memórias de um aprendiz de escritor. São Paulo, Cia. Editora Nacional, 1984*
No caminho dos sonhos. São Paulo, FTD, 1988
O tio que flutuava. São Paulo, Ática, 1988
Os cavalos da República. São Paulo, FTD, 1989
Pra você eu conto. São Paulo, Atual, 1991
Uma história só pra mim. São Paulo, Atual, 1994
Um sonho no caroço do abacate. São Paulo, Global, 1995
O Rio Grande farroupilha. São Paulo, Ática, 1995
Câmera na mão, o guarani no coração. São Paulo, Ática, 1998
A colina dos suspiros. São Paulo, Moderna, 1999
O livro da medicina. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 2000
O mistério da casa verde. São Paulo, Ática, 2000
O ataque do comando P.Q. São Paulo, Ática, 2001
O sertão vai virar mar. São Paulo, Ática, 2002
Aquele estranho colega, o meu pai. São Paulo, Atual, 2002
Éden-Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 2002
O irmão que veio de longe. Idem, idem
Nem uma coisa, nem outra. Rio, Rocco, 2003
Aprendendo a amar - e a curar. São Paulo, Scipione, 2003
Navio das cores. São Paulo, Berlendis & Vertecchia, 2003
Livro de Todos - O Mistério do Texto Roubado. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008. Obra coletiva (Moacyr Scliar e vários autores), ISBN 9788570606129

Crônicas
A massagista japonesa. Porto Alegre, L&PM, 1984
Um país chamado infância. Porto Alegre, Sulina, 1989
Dicionário do viajante insólito. Porto Alegre, L&PM, 1995
Minha mãe não dorme enquanto eu não chegar. Porto Alegre, L&PM, 1996. Artes e Ofícios, 2001
O imaginário cotidiano. São Paulo, Global, 2001
A língua de três pontas: crônicas e citações sobre a arte de falar mal. Porto Alegre

Ensaios
A condição judaica. Porto Alegre, L&PM, 1987
Do mágico ao social: a trajetória da saúde pública. Porto Alegre, L&PM, 1987; SP, Senac, 2002
Cenas médicas. Porto Alegre, Editora da Ufrgs, 1988. Artes&Ofícios, 2002
Enígmas da culpa. São Paulo, Objetiva, 2007

Citações
"Acredito, sim, em inspiração, não como uma coisa que vem de fora, que "baixa" no escritor, mas simplesmente como o resultado de uma peculiar introspecção que permite ao escritor acessar histórias que já se encontram em embrião no seu próprio inconsciente e que costumam aparecer sob outras formas — o sonho, por exemplo. Mas só inspiração não é suficiente".

Você esta certo meu amigo. Não só as férias são curtas a vida também.

Que pessoas de idade aprendam a usar o computador, que façam esporte, que cuidem da aparência, que aprendam a andar de moto, tudo bem. Mas que renunciem à sua própria vida, à sua identidade, essa não.

A gente pensa que padrões de beleza dependem exclusivamente de gostos pessoais, de idiossincrasias. É verdade, mas só em parte. Quando achamos uma mulher bela, não estamos apenas aplicando padrões estéticos pessoais.

Você sempre viveu no ar. Agora está na hora de colocar os pés no chão.

O problema, concluiu antes de expirar, é que a gente não pode ter tudo o que se quer na vida.

Sorria pode ser, portanto, um bom conselho, na medida em que o sorriso, atributo caracteristicamente humano, possa ser um indicador do sentimento de felicidade.

Vivemos novos tempos e temos de nos adaptar a eles. O importante é que as pessoas continuam se querendo. A tecnologia e os hábitos mudam. O amor, mesmo à distância, continua igual.

Cordas

O mundo
O meu
Vira
Vira
O meu
Mundo
Gira
e no girar
Me sinto perdida
E me encontro
e me perco
Constante
E inconstante
Feliz
Vibrante
Triste
Delirante
Tenho orelhas
Que esticam
E se fecham
Por detalhes
As vezes pequenos
As vezes grandes
Não se vive só de sorrisos
Não se vive só de amor
Tenho as ondas dos cabelos de Elvis
O lírismo poético das canções
Tenho cigarros
Tenho bebidas
E tenho a vida toda pela frente
Sou a dona
A juiza
A astrônoma
A mulher da minha vida
Eu sou
Ela.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Bonequinha de luxo

Audrey Hepburn e Truman Capote são dois nomes que poderiam ser considerados simétricos. O charme e delicadeza de uma, confrontada com o modernismo e a realidade crua e cheia de adjetivos do outro indicava que uma combinação desses dois nomes era algo simplesmente impossível de se acontecer no cinema. Eis que, em 1961, o diretor Blake Edwards conseguiu a proeza de adaptar uma história do ousado escritor de personagens complexos e de morais duvidosas com a delicada Hepburn como protagonista de uma obra cinematográfica. O resultado é pesado, bonito e delicado.

A história gira em torno de Holly Golightly (Hepburn), uma jovem e linda mulher de Nova York que está decidida a mudar de vida casando com um milionário – sua inocência ao tomar os cafés da manhã em frente à clássica loja Tiffany’s quase se confunde com a futilidade das mulheres caçadoras de dinheiro. Só que sua vida muda quando ela conhece ‘Fred’ (George Peppard), um escritor frustrado que vive sustentado pela amante, colocando os próprios conceitos de Holly contra ela mesma ao se relacionarem de forma mais intensa.

Um dos grandes méritos de Edwards é conseguir fazer um romance urbano de maneira tão clássica e bela. Por vários momentos, dada a construção do luxo imaginário da personagem, temos uma linda direção de arte que se confunde com a fumaça da realidade de Nova York, fotografando de forma diferente a cidade. Mas não espere ver uma história grandiosa, cheia de cifras; tudo em Bonequinha de Luxo é muito real o suficiente para convencer não como uma fábula, mas sim como um drama verdadeiro de uma pessoa que apenas quer vencer na vida. Só que, graças à delicadeza como tudo é contado, temos um resultado final extremamente interessante e contrastante.

É óbvio que Holly é uma garota de programa, mas pelo olhar ingênuo que Hepburn concede à personagem ela torna-se extremamente dócil e sonhadora. Nunca vemos com maldade o que ela quer fazer, pelo contrário, simpatizamo-nos imediatamente com seu jeitinho e com seus sonhos. Ela está deslumbrante e simplesmente apaixonante no filme, mesmo que raramente apareça muito produzida – Hepburn é simplesmente fantástica por natureza e consegue carregar nas costas o fardo de um papel mais pesado como esses de maneira extremamente graciosa (claro que deram uma amaciada na personagem, afinal, estamos falando de Trumam Capote; por exemplo, a bissexualidade de Holly foi deixada de lado).

Há defeitos, claro: o oriental reclamão vizinho de Holly (interpretado pelo excepcional Mickey Rooney) é desnecessário o suficiente para aparecer tantas vezes em tela (serve apenas para impulsionar uma ação que move o final do filme, nada mais), dando um tom cômico desnecessário à trama (e nem tão engraçado assim). Mas quando cenas como a canção na janela, a despedida do Doc e o final na chuva ficam martelando em nossa cabeça, temos a certeza de que fomos presenteados com momentos fortes o suficiente para tornar a obra inesquecível.

Assim como grandes filmes dos anos 60 / 70 (como, por exemplo, Perdidos na Noite), Bonequinha de Luxo mostra a luta de pessoas comuns que querem vencer na vida de qualquer maneira. Só que somando uma encantadora Audrey Hepburn com uma forma charmosa diferente de filmar um drama urbano do gênero, o resultado torna-se bastante curioso. Vale uma conferida, sendo fã dos grandes romances do cinema ou apenas um estudioso de plantão. Tem classe, charme e beleza suficientes para agradar a qualquer um.

Crítica: Rodrigo Cunha/Cineplayers

Vermelho e branco

Momentos
As vezes lúcidos
As vezes loucos
Uns falam de amor
Outros de coisas banais
Alguns vão com o tempo
Outros são imortais
De dia
De noite
De tarde
As madrugadas aparecem
E ela está lá
Tenra
E branca
A luz que irradia
E sorri
E chora
Quando vai embora
Passa tempo
Passatempo
Passa tempo
Passa
E traz tudo de volta
E não me faça lembrar
Dessa tal de saudade
Á saudade
Há.

Alexandre Dumas, pai

Alexandre Dumas, pai (Villers-Cotterêts, 24 de julho de 1802 — Puys, 5 de dezembro de 1870) foi um romancista francês. Seu nome de batismo era Dumas Davy de la Pailleterie. Nasceu na região de Aisne, próximo a Paris. Era neto do marquês Antoine-Alexandre Davy de la Pailleterie e de uma escrava (ou liberta, não se sabe ao certo) negra, Marie Césette Dumas. Seu pai foi o General Dumas, grande figura militar de sua época.

Carreira literária
Enquanto trabalhava em Paris, Dumas começou a escrever artigos para revistas e também peças para teatro. Em 1829 foi produzida sua primeira peça, Henrique III e sua Corte, alcançando sucesso de público. No ano seguinte, sua segunda peça, Christine, também obteve popularidade. Como resultado, tornou-se financeiramente capaz de trabalhar como escritor em tempo integral. Entretanto, em 1830, participou da revolução que depôs o rei Carlos X de França e substituiu-o no trono pelo ex-patrão de Dumas, o Duque d'Orléans, que governaria com o nome de Luís Filipe de França, alcunhado de Rei Cidadão.

Até meados da década de 1830, a vida na França permaneceu agitada, com tumultos esporádicos em busca de mudanças promovidos por republicanos frustrados e trabalhadores urbanos empobrecidos. À medida que a vida retornava lentamente à normalidade, o país começou a se industrializar e, com uma economia em crescimento combinada com o fim da censura à imprensa, a vida recompensou as habilidades de escritor de Alexandre Dumas.

Após escrever mais algumas peças de sucesso, passou a se dedicar aos romances. Apesar de ter um estilo de vida extravagante e sempre gastar mais do que ganhava, Dumas provou ser um divulgador astuto. Com a alta demanda dos jornais por romances seriados, em 1838 simplesmente reescreveu uma de suas peças para criar sua primeira série em romance. Intitulada "O Capitão Paulo" (em francês Le Capitaine Paul) levou-o a criar um estúdio de produção que lançou centenas de histórias, todas sujeitas à sua apreciação pessoal.

Em 1840, casou-se com uma atriz, Ida Ferrier, mas continuou a manter seus casos com outras mulheres, sendo pai de pelo menos três filhos fora do casamento. Um desses filhos, que recebeu o seu nome, seguiria seus passos na carreira de novelista e escritor de peças teatrais. Por causa do mesmo nome e da mesma profissão, para distinguir um do outro, um é chamado Alexandre Dumas pai (Alexandre Dumas, père) e o outro Alexandre Dumas, filho (em francês, Alexandre Dumas, fils).

Seu trabalho como escritor lhe rendeu muito dinheiro, porém Dumas vivia endividado por conta de seu alto gasto com mulheres e de seu estilo de vida. O grande e dispendioso château que construiu estava constantemente cheio de pessoas estranhas que se aproveitavam de sua generosidade. Com a deposição do rei Luís Filipe após uma revolta, não foi visto com bons olhos pelo presidente recém-eleito, Napoleão III, e em 1851 Dumas teve que ir embora para Bruxelas para fugir de seus credores. Dali viajou à Rússia, onde o francês era a segunda língua falada e suas novelas também eram muito populares.

Dumas passou dois anos na Rússia antes de se mudar em busca de aventuras e inspiração para mais histórias. Em março de 1861, o reino da Itália foi proclamado, com Vítor Emanuel II como rei. Nos três anos seguintes, Alexandre Dumas se envolveria na luta pela unificação da Itália, retornando a Paris em 1864.

Apesar do sucesso e das ligações aristocráticas de Alexandre Dumas, sua vida sempre foi marcada por ser mulato. Em 1843, escreveu uma curta novela intitulada Georges, que chamava atenção para alguns aspectos raciais e para os efeitos do colonialismo. Apesar disso, atitudes racistas contrárias à sua posição legítima na história da França ainda bem depois de sua morte, 5 de dezembro de 1870.

Alexandre Dumas, pai, escreveu romances e crônicas históricas com muita aventura que estimulavam a imaginação do público francês e de outros países nos idiomas para os quais foram traduzidos. Alguns destes trabalhos foram:

O Conde de Monte Cristo
Os Irmãos Corsos

Os romances de D'Artagnan
Os Três Mosqueteiros (Les Trois Mousquetaires, 1844)
Vinte anos depois (Vingt Ans Après, 1845)
O Visconde de Bragelonne (Le Vicomte de Bragelonne, ou Dix ans plus tard, 1847) - (do qual faz parte O Homem Com a Máscara de Ferro)

Os romances Valois
A Rainha Margot (1845)
A Dama de Monsoreau (1846)
Os Quarenta e Cinco (1847)
Memórias de um Médico
Joseph Balsamo (1849)
O Colar da Rainha (1850)
Ange Pitou (1851)
A Condessa de Charny (1853)
O Cavaleiro da Casa Vermelha (1854)

Citações
"O orgulho de quem não pode construir é destruir."

"Toda generalização é perigosa, inclusive esta."

"Todos por um, um para todos."

"Os versos estavam longe de ser excelentes; mas como se sabe, os protestantes não se presumiam de poetas."

"A felicidade faz bem até mesmo aos maus."

"É necessária a desgraça para provocar certas minas misteriosas ocultas na inteligência humana; é precisa a pressão para fazer estourar a pólvora."

"As feridas morais tem a particularidade de que se escondem, mas não se fecham; sempre dolorosas, sempre prontas a sangrar quando são tocadas, ficam vivas e abertas no coração."

"Há situações que os homens apreciam com seu instinto, mas que não podem comentar com sua inteligência."

"Para todos os males, há dois remédios: o tempo e o silêncio."

"Este é um dos orgulhos da nossa funesta humanidade: cada homem julga-se mais infeliz que outro infeliz que chora e geme ao seu lado."

"A sabedoria humana termina por inteira nestas palavras: Confiar e esperar!"

Desordem

Pessoas desconhecidas
Aberrações
Perversidade
Sadismo
Olhar abstrato sobre tudo
Sobre nada
Amor
Falta de amor
Paranóia evidente
Palavras desordenadas
Que bagunçam minha mente
Gestos obscenos
Futilidade
Seres baixos
Esdrúxulos
Escrotos
Bichos demoníacos
Deuses e anjos
Flores caídas
Idealismos alternativos
Loucura, a loucura
Domina meu ser
Louco
Como o mundo me vê.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

O Lutador

O novo filme de Darren Aronofsky é uma das seletas obras que levarei comigo a vida toda. Aronofsky, aliás, não é estranho a essa minha lista pessoal de paixões cinematográficas avassaladoras. Requiem Para Um Sonho e Pi também a integram. Mas se esses me assombram cada vez que os assisto, O Lutador me emociona e me faz ter vontade de aplaudir de pé. Um sujeito atrás de mim no cinema, menos preocupado em passar vergonha, o fez. O invejei. As palmas ficaram presas - mas as disparo aqui. O filme adapta o livro que Robert Siegel escreveu sobre Randy "The Ram" Robinson, um astro ficcional da luta-livre dos anos 1980.

Vinte anos depois de seu auge, The Ram (Mickey Rourke) segue fazendo a única coisa que sabe: lutar. Mas os tempos são outros, ele envelheceu, os fãs são poucos e o dinheiro é escasso. Mesmo assim essa espécie de tio-avô bombado dos lutadores mais jovens segue se apresentando. Até o enfarto, depois de uma luta...

Forçado pelos médicos a interromper sua longeva carreira, ele começa a trabalhar no balcão de frios de um supermercado. Enquanto isso, tenta fazer as pazes com sua filha (Evan Rachel Wood) e procura algum alento romântico com uma stripper (Marisa Tomei, ousada e excelente). Mas surge, então, a proposta para uma luta com o seu maior rival, o Aiatolá (Ernest Miller), e fica difícil para The Ram resistir...

Não se trata, como a premissa pode dar a entender, de um típico filme de superação. The Ram não tem qualquer interesse em superar-se. Quer apenas continuar fazendo o que faz melhor... golpear pessoas e ser golpeado enquanto veste colante. É curioso notar como essa motivação não é muito diferente das experiências pessoais de Mickey Rourke. Também um astro oitentista, Rourke desapareceu durante anos, relegado a pontas ou projetos medíocres. Uma oportunidade de retorno surgiu em Sin City, mas não decolou. A redenção chega agora com, em que personagem, que se autointitula "um velho pedaço moído de carne", e ator se confundem em sua mútua redenção.

Rourke está maravilhoso como The Ram e o roteiro tem construção de personagem irretocável, visual e psicológica. O lutador/ator encanta em sua entrega ao filme tanto nos ringues quanto fora deles. As cenas de lutas são profissionais e de um realismo fora do comum (Rourke chegou a cortar-se de verdade nas cenas, de propósito), algo que pode até chocar os mais sensíveis, especialmente a cena da luta contra o Necrobutcher. Para mim, o choque veio mesmo é nas cenas mais cotidianas, como no primeiro e metafórico dia de Ram no balcão de frios, seu bem-humorado contato com a clientela. Chorar durante uma cena cômica - e não me refiro a chorar de rir - foi algo inédito para mim.

Com uma interpretação tão poderosa, Aronofsky só poderia mesmo ter optado pela câmera na mão, naturalista. Ele, literalmente, precisa sair da frente de Rourke em determinadas cenas. A direção voyeuristica, porém, torna-se explosiva durante as lutas, apoiada pela excelente trilha sonora, que mistura clássicos do heavy rock com as músicas incidentais tocadas por Slash e compostas por Clint Mansell.

Por baixo das calças de lycra, dos cabelos compridos e do sangue dos ferimentos, O Lutador esconde uma tragicômica discussão: você é definido pelo que você faz? The Ram não tem a resposta a essa pergunta - mas limita-se a oferecer sua contundente opinião, uma tão fulminante quanto seu golpe voador com cotovelada. Doa a quem doer.

Crítica: Érico Borgo/Omelete

Dádiva

Viriam tardes com chuva
Dias com sol
As pessoas passariam na minha vida
Várias delas
Homens
Mulheres
Seres comuns
Seres exóticos
E a cada dia menos ficariam
Até que uma só ficasse todos os dias
Eu começaria o ciclo novamente
O filho
Viraria pai
A filha
Viraria mãe
E algo puro aconteceria
Só entendemos o sentido da vida
Quando vemos pés infantis se mexendo
O olhar de uma criança te transforma
E te leva pra lugares que jamais imaginou chegar
Você deixa de se priorizar
E entende o valor que tem em viver
Passará por momento difíceis
Não dormirá algumas noites
Para vigiar o sono dos pequenos
Acompanhará os primeiros passos
Trocará fraldas
Fará curativos nas feridas dos tombos
Aprontará a papinha
Comprará roupas novas
Contará histórias de princesas e reis
Verá os mesmos filmes infantis cem vezes
Ouvirá as mesmas músicas todos os dias
E nada disso importará
Pois irá sorrir com pureza
Quando te chamarem de papai.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

James Joyce

James Augustine Aloysius Joyce (Dublin, 2 de fevereiro de 1882 — Zurique, 13 de janeiro de 1941) foi um romancista, contista e poeta irlandês expatriado. É amplamente considerado um dos autores de maior relevância do século XX. Suas obras mais conhecidas são o volume de contos Dublinenses/Gente de Dublin (1914) e os romances Retrato do Artista Quando Jovem (1916), Ulisses (1922) e Finnegans Wake (1939) - o que se poderia considerar um "cânone joyceano". Também participou dos primórdios do modernismo poético em língua inglesa, sendo considerado por Ezra Pound um dos mais iminentes poetas do imagismo.

Embora Joyce tenha vivido fora de seu país natal pela maior parte da vida adulta, suas experiências irlandesas são essenciais para sua obra e fornecem-lhe toda a ambientação e muito da temática. Seu universo ficcional enraíza-se fortemente em Dublin e reflete sua vida familiar e eventos, amizades e inimizades dos tempos de escola e faculdade. Desta forma, ele é ao mesmo tempo um dos mais cosmopolitas e um dos mais particularistas dos autores modernistas de língua inglesa.

Legado
Com a erupção da Segunda Guerra Mundial, Joyce teve de deixar Paris e por fim voltou a Zurique, quase cego, em 1940. No começo do ano seguinte, morre de úlcera duodenal perfurada e peritonite generalizada, durante uma operação para salvar sua vida . Está enterrado no Cemitério de Fluntern, naquela cidade, junto com Nora.

A obra de Joyce foi submetida a pesquisas intensas por estudiosos de todos os tipos, e ele é um dos autores mais notáveis do século XX. Também foi influência importante para autores tão diversos quanto Beckett, Jorge Luis Borges, Flann O'Brien, Máirtín Ó Cadhain, Salman Rushdie, Thomas Pynchon, William Burroughs e muitos outros. Haroldo de Campos considera sua obra, em prosa e em verso, de importância central para a poesia posterior a ela.

A influência de Joyce também se faz sentir em campos alheios à literatura. A frase "Three Quarks for Muster Mark", no Finnegans Wake, é a fonte para a palavra quark, na Física, que designa um dos muitos tipos de partícula elementar. O nome foi proposto pelo físico Murray Gell-Mann. O filósofo francês Jacques Derrida publicou um livro sobre o uso da linguagem em Ulisses, e o filósofo americano Donald Davidson fez o mesmo com o Finnegans Wake, comparando-o com Lewis Carroll.

Celebra-se anualmente a vida de Joyce no dia 16 de junho, o Bloomsday, em Dublin e num número cada vez maior de cidades ao redor do mundo. Em 2004, a capital irlandesa realizou o festival Bloomsday 100, que durou cinco meses (de abril a agosto) e se propunha a reaproximar a cidade e a obra de seu estimado filho. Um dos maiores eventos foi um café da manhã para milhares de pessoas na O'Connell Street, a principal da cidade.

Poesia
Seus primeiros poemas (Música de Câmara, 1907), líricos, de influência simbolista e feitos para serem letras de música, continham, no entanto uma visualidade e objetividade que os aproximavam do, posterior, imagismo de Pound, além do uso de arcaísmos combinados à alguns neologismos. Joyce publicará, em 1927, seu segundo livro de poesia, Pomas, um Tostão Cada, próximo da radicalidade das suas mais ousadas obras em prosa.

Escreve também Ecce Puer, um poema escrito em 1932, sobre dois eventos próximos, a morte de seu pai e o nascimento de seu neto. Publica-os, juntamente com a demais obra poética, em Collected Poems (Poesia reunida), em 1936. Apesar de ser autor de um trabalho muito elogiado por poetas como o próprio Pound, que o considerava um brilhante inovador do ritmo, Joyce se considerava um poeta frustrado.

Obra
Música de Câmara (1907)
Dublinenses (1914)
Retrato do Artista Quando Jovem (1916)
Exilados (1918)
Ulisses (1922)
Pomas, um Tostão Cada (1927)
Finnegans Wake (1939)
Stephen Herói, Giacomo Joyce

Citações
A única exigência que faço aos meus leitores é que devem dedicar as suas vidas à leitura das minhas obras.

Certa vez - e que linda vez que isso foi!

A personalidade do artista passa para a narração mesma, enchendo, enchendo de fora para dentro as pessoas e a ação com o um mar vital.

Apega-te ao agora, ao aqui, através dos quais todo o futuro mergulha no passado.

Não se pode comer o bolo e continuar a tê-lo.

Melhor escapar um culpado do que noventa-e-nove erroneamente condenados.

Direção

Dei dez passos pra direita, depois dez pra esquerda, e lá estava eu no mesmo lugar, era engraçado como às vezes poderíamos ser tão idiotas, andei dez pra frente e sorri, não porque me sentia idiota, mas porque eu sabia que eu podia andar pra onde quisesse, meu senso de liberdade estava funcionando, lá fora um mundo todo me esperava, seja lá o que eu fosse fazer, estariam ali esperando meu próximo passo, minha próxima frase, e eu as falaria, as vezes rapidamente, as vezes pausadamente, tentaria mudar ao menos o meio em que vivo e tornar nossa existência menos ridícula, hoje era um dia bom, eu tinha visto novamente as cores lá fora, sentia o cheiro das coisas outra vez, eu enxergava as pessoas do jeito que elas eram de fato, uma sensação boa tomava conta de mim, meu senso de impotência desaparecia aos poucos e o universo parecia a voltar a conspirar a meu favor, eu era só um jovem escritor e tinha a vida toda pela frente.

Discurso do Rei

A temática do filme de superação nunca foi tão verbal como em O Discurso do Rei (The King's Speech, 2010). O drama, ambientado às portas da Segunda Guerra Mundial, trata da dificuldade de um líder em executar uma de suas necessidades fundamentais: falar em público.

Albert Frederick Arthur George (1895-1952), pai da atual rainha da Inglaterra, Elizabeth II, era o segundo na linha de sucessão do Rei George V (1865-1936), depois de seu irmão Edward (1894-1972). Por ser o caçula da Casa de Windsor, ninguém esperava que Albert assumisse o trono, o que aconteceu em 1936, quando o irmão, interessado muito mais em sua própria felicidade do que na do império britânico, abdicou. Mas o que faz um monarca quando, em um dos momentos mais dramáticos da história, é incapaz de transmitir suas ordens e dirigir-se ao povo sem gaguejar?


O problema do Rei George VI, até aqui pouco mais que um curioso rodapé histórico, vira figura central no filme de Tom Hooper, que já havia abordado um lado muito mais cinematográfico da monarquia britânica em Elizabeth.

Pelo tema sisudo e roteiro centrado em diálogos, O Discurso do Rei daria um filme classicista, não fosse o uso extremamente competente da linguagem cinematográfica para ajudar a contar as aflições do rei Albert. Hopper conta com a direção de fotografia de Danny Cohen, que enquadra seu protagonista (vivido por Colin Firth) sempre nos cantos, em planos frontais, mas que beiram milimetricamente o plongée (de cima para baixo). O desequilíbrio cria uma sensação de desconforto, evidenciando o sentimento de inadequação do monarca.

A câmera funciona igualmente bem para o outro lado da moeda, Lionel Logue (Geoffrey Rush), um inadequado de outro tipo - fonoaudiólogo nada ortodoxo que tem a tarefa de ensinar Albert a expressar-se com clareza. O embate de ideias (e educações) é fundamental ao filme e o trabalho de Cohen, que compreende também excelentes sequências de plano e contraplano - que desfrutam do citado desequilíbrio -, participa dele com voz firme.

Alheios a tudo isso e focados em suas próprias tarefas, Colin Firth e Geoffrey Rush executam seus trabalhos de maneira inspirada. O primeiro dá ao rei a inconstância física e dualidade que o papel exige. Na vida íntima, com a esposa e filhas, surge terno e fala com fluidez reservada. Quando precisa desempenhar seu papel como nobre, porém, mantém a dignidade e o porte, mas gagueja de maneira dolorosa de assistir. Fica ainda mais evidente a qualidade do trabalho de Firth quando o vemos durante longas cenas ao lado de Geoffrey Rush. Lionel é um papel menos exigente - e Rush um ator dotado de mais recursos (sua internalização na cena do ensaio da coroação na catedral é brilhante) -, o que poderia enterrar um trabalho menos competente. Se atuar é a arte de reagir, Firth e Rush engajam-se em suas reações como ninguém.

É também um alívio ver, depois de tantos Harry Potter e filmes de Tim Burton, Helena Bonham Carter deixando de lado suas pesonagens estridentes para dedicar-se a uma mulher normal. A atriz interpreta a esposa de Albert com interesse. O elo fraco é mesmo Timothy Spall. Ainda que excelente ator (basta vê-lo em Agora ou Nunca de Mike Leigh), ele dá um peso desnecessário às aparições de Winston Churchill. O inglês era, sim, uma figura que parecia saída de um desenho, mas Spall se entregou às caras e bocas na oportunidade de interpretá-lo. Ao menos sua participação é breve.

Hooper também é extremamente feliz na criação da atmosfera de ameaça vindoura da Segunda Guerra. O grande antagonista do filme é o microfone - o inimigo a ser tornado aliado -, mas o eloquente Adolf Hitler também faz rápida aparição. A cena em que o Rei Albert o observa discursando, franjinha em desalinho devido ao esforço teatral, é quase cômica. As proverbiais nuvens que prenunciam tempestades também surgem na forma de uma sequência na névoa distante, em que paciente e terapeuta brigam sob uma opressiva luz difusa.

Com o intuito de colher informações para escrever o filme, David Seidler, o octogenário roteirista de O Discurso do Rei, conta que procurou a Rainha Mãe, Elizabeth Bowes-Lyon (a viúva do Rei George VI, morta em 2002), algumas décadas depois dos fatos. "Por favor, não o faça enquanto eu estiver viva. A memória desses eventos ainda é muito dolorosa", ela escreveu de volta.

Dolorosa ou não, a história não poderia ter sido contada de maneira mais elegante em O Discurso do Rei.

Crítica: Érico Borgo/Omelete

Certezas

Penso em algo
Logo
Existo
Vivo
Dias e horas
Em busca de respostas
De perguntas que não faço
De idéias não aplicadas
E sentidos não desejados
Amor
É o que sinto
Calor
Me desespera
Sentir é meu desejo
Cantar é o que me alegra
Viver só por você
É a mais perfeita regra

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Alain Robbe-Grillet

Alain Robbe-Grillet (Brest, 18 de agosto de 1922 — Caen, 18 de fevereiro de 2008) foi um escritor e cineasta francês. Era, assim como Nathalie Sarraute, Michel Butor e Claude Simon, uma das figuras mais associadas com o movimento denominado nouveau roman ("novo romance").

Robbe-Grillet era membro da Académie française desde 25 de março de 2004, quando sucedeu Maurice Rheims na cadeira número 32. Deixou viúva a também romancista Catherine Robbe-Grillet.

Romances
Un régicide (1949)
Les Gommes (1953)
Le Voyeur (1955)
La Jalousie (1957)
Dans le labyrinthe (1959)
La Maison de rendez-vous (1965)
Projet pour une révolution à New York (1970)
Topologie d'une cité fantôme (1976)
Souvenirs du Triangle d'Or (1978)
Djinn (1981)
La Reprise (2001)
Un roman sentimental (2007)

Coletâneas
Instantanés (1962)

Ensaios
Pour un Nouveau Roman (1963)
Le Voyageur, essais et entretiens (2001)
Ficções de carácter autobiográfico
Le miroir qui revient (1985)
Angélique ou l'enchantement (1988)
Les Derniers Jours de Corinthe (1994)

Citações
O verdadeiro escritor não tem nada a dizer. O que conta é o modo que ele diz.

Para um escritor, não existem duas maneiras possíveis de escrever um mesmo livro. Quando pensa num futuro romance, é sempre um estilo que antes de mais nada lhe ocupa a mente e que exige sua mão. Tem na cabeça movimentos de frases, arquiteturas, um vocabulário, construções gramaticais, exatamente como um pintor tem na cabeça linhas e cores. O que acontecerá no livro vem depois, como que segregado pelo próprio estilo. E, uma vez terminada a obra, o que surpreenderá o leitor ainda é essa forma que se pretende desprezar, forma esta cujo sentido frequentemente ele não poderá dizer com exatidão, mas que constituirá para ele o mundo particular do escritor.

A carne das frases sempre ocupou, sem dúvida, um grande espaço no meu trabalho. Mas se não estou na minha mesa. Mesmo se não estou na minha mesa, suas figuras movediças não cessam de me perseguir. Repito palavras, ritmos, experimento sonoridade, organizo ecos e rupturas.

Essa incansável atividade, pela qual as mãos pacientes esposam com lentidão a própria matéria da linguagem, ao mesmo tempo firme e fluida, sua prosódia, sua textura, apresenta claramente um caráter antes de tudo sensual.

Sorrisos curtos, histórias longas.

Era uma noite estranha
Minha mente me avisava que algo estava errado
Eu não tinha vontade de falar
De sorrir
De contar qualquer que fosse a história
Era uma noite
Não como as que eu estava acostumado a ter
Mas era noite
E a noite me trazia algo que eu não sabia o que era
Talvez uma mistura
De angústia e tristeza
Eu precisava sair lá fora de novo
Ver qual era a cor das pessoas
Me reduzia a poucos metros
Um quarto pequeno e abafado
Nos dias de calor
E gelado demais nos dias de frio
Por aqui passaram sorrisos
E lágrimas
Os dois com a mesma intensidade
Os melhores
E piores dias da minha vida
Eram mais 24 horas que iam
E eu que ficava no tempo
Esperando que alguma coisa acontecesse
E que me fizesse se sentir
Humano
Como deveríamos ser.

A Separação

Tem diretor brasileiro que diz que gente rica não rende boas histórias, mas os filmes do iraniano Asghar Farhadi estão aí, ganhando espaço em festivais e premiações, para desmentir.

Os dois mais recentes, Procurando Elly e A Separação, não tratam de "gente rica" como estereótipo - a madame com o champanhe - mas de pessoas de classe alta, com seus anseios particulares, do melhor ensino para os filhos a viagens ao exterior. Que tiram dias para ir à praia, como os personagens de Procurando Elly, ou preocupam-se com seus livros numa mudança, como a protagonista de A Separação.

O que gera interesse nesses filmes de Farhadi é o choque da classe alta - em teoria, secularista e modernizada - com os costumes fundamentalistas da sociedade iraniana. Um choque que frequentemente expõe não só o conhecido atraso das leis do país como também uma hipocrisia de quem, novamente teoricamente, seria o lado mais progressista dessa equação, os "esclarecidos".
A separação que dá nome ao filme já começa praticamente consumada. Simin (Leila Hatami) e Nader (Peyman Moadi) estão diante de um juiz para acertar o divórcio; ela quer morar fora do Irã e levar sua filha, enquanto o marido insiste em ficar em Teerã para cuidar de seu pai idoso, que tem Alzheimer. O juiz nega o divórcio, pois não há, no seu entender, um fato suficientemente grave para justificar a separação.

Contar o que acontece depois - envolvendo uma empregada religiosa, a filha do casal e uma gravidez de risco - tiraria um pouco do peso do filme. Vale dizer apenas que a trama de A Separação retorna constantemente para a mesa de um juiz. Se em Procurando Elly a tensão crescente vem do desaparecimento de Elly, aqui o sufoco surge da repetição kafkiana de situações de tribunal.

Quando A Separação ganhou o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro, o ministro das relações exteriores do Irã alertou para o perigo de "dar prêmios valiosos a filmes cujo tema central é a pobreza e as dificuldades de um povo". São dois equívocos: primeiro, entender que a pobreza é o foco (Farhadi expõe mais desvios de caráter na classe alta do que na baixa); depois, confundir exploração das "dificuldades de um povo" com a análise das transformações sociais do Irã.

Transformações essas que, para nós, podem parecer trivialidades, como o fato de Simin e Nader mandarem a filha para o quarto ou a cozinha o tempo todo, enquanto discutem, e ela não atender (Farhadi enquadra a cena para mostrar que a menina permanece no ambiente). É provável que A Separação, ao contrário do grosso da produção iraniana atual, tenha sido muito bem recebido no Ocidente porque trata de uma história universal - o marido que se vê sozinho e, por orgulho, não reconhece que precisa da mulher -, a crise do patriarcado não respeita fronteiras, mas obviamente no Irã isso tem uma dimensão distinta.

No fim, o choque não é tanto entre estratos, mas entre dois momentos: o país que acreditava nos dogmas, numa predestinação social, e o país que hoje convive com a inevitabilidade da mudança, em que a cidadania se conquista diariamente. Cenas como a reconstituição do crime causam perplexidade porque são a materialização desse choque: a reconstituição em si se apoia numa "modernidade", a da análise objetiva da cena do crime, mas as mentiras escondidas pelos personagens - mentiras profundas, ancestrais - impedem qualquer objetividade.

Não por acaso, as mulheres de A Separação, quando choram, aparecem em cena já com a lágrima escorrida até o queixo - é um choro não por uma circunstância, mas por um estado estabelecido de coisas, um choro passado. Farhadi só filma um lágrima por inteiro, presente, quando é a adolescente que a chora. Tragicamente é sobre ela que recai a responsabilidade de impedir que o Irã permaneça nesse limbo aflitivo.

Crítica: Marcelo Hessel/Omelete UOL

O melhor de todos os dias

Angustia
Apreensão
Impaciência
Assim a moça se sente
Enquanto espera o rapaz de longe
Que por sua vez não vê a hora de chegar
Perdido nas estradas e nas cidades
Em busca de informação
Pra quem sabe achar o caminho
Do sorriso
Da alegria
Da felicidade
Caminhos
Que dão num lugar
Em que os dois se encontram
Ela saltita
Ele desce
Eles se olham
E andam a passos rápidos
O abraço
De quem espera a anos
O beijo
O primeiro
O perfeito
O beijo
Gostoso
Molhado
Suave
O beijo
De quem beija
E de quem sente
O olhar... Desconfiado
E o início da caminhada
Ele desconheçe o lugar
Ela se sente em casa
As ruas estranhas para ele
Deslizam pelos pés calçados dela
O carro para e pergunta
Ele responde
E continua
Por entre as ruas eles se encontram
E se perdem
Um com o outro
Perdidos como duas crianças
Acha-se o lugar
O portão de bambu
A chave de madeira
E a india no balcão
Eles adentram na natureza
A arvore gigante e velha
Tão verde e tão alta
Ela mostra pra ele
Ele se encanta
A fonte abacaxi
Mas lavada
Mas bela
Bela como a boca dela
O olho dela
O piercing dela
Como a bela
Penelope
Bela
Assim és ela
Continua-se a descer
E lá abaixo se vê um rio
Cadeiras
Quantas cadeiras
Brancas cadeiras de piscina
Circular era a piscina
Azul como a agua
Azul como o céu
As portas se abrem
As janelas se abrem
E logo se fecham
Por pura privacidade
Os labios se tocam
As mãos se tocam
Os corpos se tocam
Com leveza
E devagar, devagar
Como se eles fossem um só
E assim eles se sentiam
Naquele instante incessante
Bom pra ele
Bom pra ela
Do quarto saem os dois
Pra sentir o ar na pele
Ela fuma um cigarro
Enquanto ele olha pra ela
E conta uma das suas milhares de histórias
Ela ouve atenta
E sorri
A fome persegue os dois
Seus estômagos roncam
E saem em busca de algo
Pelas entranhas das ruas áridas
Encontra-se comida
A soda no balcão
O alimento na boca
E assim eles continuam
Na ponte azul
Surge a amiga
Com seu belo carro preto
Contando o que a aflinge
Velocidade alta
Perseguição alucinada
Logo encontram o topo
E por lá vão olhar o céu
A grama pinica as costas deles
Mas o momento é magico
Eles nem sentem
Ou fingem não sentir
Falando sobre a vida
O dia vai passando
Logo
Sem que percebam
A noite paira
E com ela vêm o medo
De que acabe
De que se separem
De que ao acordar
O dia não seja dia
E a noite não seja noite
E assim se deitam
Desnudos
E lucidos
A arara
E o peixe
E eternizam com palavras
Aquele momento único
Ela chora
Ele quer chorar
Mas se segura
Pra que ela se sinta protegida
Ele tem medo que ela fique triste
Só quer vê-la feliz
Ele a faz prometer parar
Ela promete
Eles voltam a se deitar
Como você é inquieto
Diz ela
Ele sorri
E continua a falar
E falar
E falar
E o sono pega ela de jeito
Que adormece em seus braços
Enquanto ele tosse desenfreadamente
Ele dorme
Acorda
E lá esta ela
Sonhando
Como um anjo
Daqueles que vêm pra mudar sua vida
Como aquele anjo
Que apareceu na dela
Com seu chapéu branco
E mudou muita coisa
O dia amanhece
E as horas estão próximas de acabar
O telefone toca
O banquete os espera
De lá eles voltam pro quarto
E se banham pra ir embora
A luz se apaga
As janelas se fecham
A porta se fecha
E lá vão eles novamente
Em direção a vida
Saindo de uma vez
Do sonho
Pela estrada eles conversam
E com um beijo se despedem
E assim se encerra.
O melhor de todos os dias